As investigações da Polícia Federal sobre as joias de alto valor recebidas por Jair Bolsonaro revelam uma teia de supostos crimes, inquéritos detalhados e incongruências que geram dúvidas e intensificam o debate sobre as verdadeiras implicações para o ex-presidente e seu círculo próximo.
O recente indiciamento de Jair Bolsonaro pela Polícia Federal (PF) devido ao suposto esquema de negociação ilegal de joias recebidas durante seu mandato trouxe à tona questões legais e políticas complexas. A PF acusa Bolsonaro de organização criminosa, lavagem de dinheiro e peculato. Além dele, outros onze envolvidos, incluindo ex-ministros e assessores, também foram indiciados. As joias, de alto valor patrimonial, somaram inicialmente mais de R$ 25 milhões, posteriormente esse valor foi reduzido para R$ 6 milhões. A devolução desses itens e incongruências no relatório da PF geram dúvidas e intensificam o debate sobre a verdadeira natureza das acusações.

Como Acusações de Corrupção e Incongruências no Relatório da PF Envolvem Bolsonaro e Seus Aliados
O recente indiciamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) pela Polícia Federal (PF), no dia 4 de julho de 2024, pelo suposto esquema de negociação ilegal de joias presentiadas por delegações estrangeiras à Presidência da República tem gerado um intenso debate no Brasil. A investigação, que aponta para um desvio de bens de alto valor patrimonial, trouxe à tona questões legais e políticas que envolvem não só o ex-presidente, mas também ex-ministros e assessores.
Quais sãos os supostos crimes de Jair Bolsonaro no caso das Joias indicadas pela Polícia Federal
A Polícia Federal está investigando um suposto desvio de joias que foram recebidas por Jair Bolsonaro durante seu mandato presidencial. As joias, que são de alto valor patrimonial, incluem peças luxuosas que teriam sido presenteadas ao ex-presidente em várias ocasiões. Segundo relatório que somam-se 2.041 páginas elaborado pela PF e que é assinado pelo Delegado de Polícia Federal Fábio Alvarez Shor, traz indícios de crimes cometidos por Bolsonaro. O ex-presidente foi indiciado por três crimes:
1) Organização criminosa, com pena que vai de um à três anos de prisão;
2) Lavagem de dinheiro, com pena que vai de três à dez anos de prisão;
3) Peculato (apropriação de bem público), com pena que vai de dois à doze anos de prisão.
Além de Bolsonaro a PF indiciou mais onze pessoas que também teriam participado do esquema de apropriação indevida das joias.
Quem são os indiciados pela Polícia Federal no caso das joias de Bolsonaro
1) Jair Messias Bolsonaro, ex-presidente da República, indiciado por associação criminosa, lavagem de dinheiro e peculato (apropriação de bem público);
2) Bento Costa Lima Leite de Albuquerque Júnior, ex-ministro de Minas e Energia, indiciado por apropriação e associação criminosa;
3) Fábio Wajngarten, ex-chefe da Secretaria de Comunicação Social e advogado de Bolsonaro, indiciado por lavagem e associação criminosa;
4) Frederick Wassef, advogado de Bolsonaro, indiciado por lavagem e associação criminosa;
5) José Roberto Bueno Junior, ex-chefe de gabinete do Ministério de Minas e Energia, indiciado por associação criminosa, lavagem de dinheiro e apropriação;
6) Julio Cesar Vieira Gomes, ex-secretário da Receita Federal, indiciado por associação, lavagem, apropriação e advocacia administrativa perante a administração fazendária;
7) Marcelo Costa Câmara, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, indiciado por lavagem de dinheiro;
8) Marcelo da Silva Vieira, ex-chefe do setor de presentes durante o governo Bolsonaro, indicado por apropriação e associação criminosa;
9) Marcos André dos Santos Soeiro, ex-assessor do ex-ministro de Minas e Energia, indiciado por apropriação e associação criminosa;
10) Mauro Cesar Barbosa Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, indiciado por associação criminosa, lavagem de dinheiro e peculato.
11) Mauro Cesar Lourena Cid, general da reserva e pai de Mauro Cid, indicado por lavagem e associação criminosa;
12) Osmar Crivelatti, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro; indicado por lavagem e associação criminosa.
Quais são as joias que levaram a Polícia Federal indiciar o ex-presidente Jair Bolsonaro
Ainda nas primeiras páginas do relatório da PF, é apresentado três kit’s de joias que segundo Fábio Alvarez Shor (delegado que assina o relatório) indicam que Bolsonaro cometeu crimes.
“…foram identificados três principais eventos que serão abordados com suas minúcias e detalhes separadamente. Ao final observar-se-á a relação entre estes eventos”, trecho do relatório da Polícia Federal, parte 1, página 4.
1) EVENTO 1 – ARVORE e BARCO: O evento a ser descrito está relacionado a dois objetos chamados de árvore e barco. O primeiro item seria uma “Palm Tree”. O segundo item seria uma escultura de uma embarcação típica do oriente médio, chamada de “dhow”.
2) EVENTO 2 – KIT ROSÊ: O evento a ser descrito está relacionado com um conjunto (kit) de joias composto por abotoaduras, um terço, anel e relógio confeccionados em ouro rosê. O pacote teria entrado no país em outubro de 2021 na comitiva do ex-Ministro de Minas e Energia (MME) Bento Albuquerque. Na mídia é conhecido como 2º kit de joias.
3) EVENTO 3 – KIT OURO BRANCO: Este evento está relacionado ao kit de joias composto por um relógio Rolex, caneta da marca Chopard, par de abotoaduras, anel e rosário árabe. O pacote teria sido recebido, segundo informações em fontes abertas, em uma viagem oficial a Doha, no Catar, e em Riade, na Arábia Saudita, entre os dias 28 e 30 de outubro de 2019. Na mídia é conhecido como 3º kit de joias.

No decorrer do relatório, surgem outros itens, como as “joias femininas,” item que trouxe polêmica no início de 2023, quando foram retidas na alfândega do aeroporto de Guarulhos enquanto eram transportadas pelo assessor do ex-ministro Bento Albuquerque. As joias, presente do governo Saudita em 2021, eram destinadas à então primeira-dama, Michele Bolsonaro.

Outro item que surge no relatório é o relógio Patek Philippe, onde “não há qualquer registro do presente nos sistemas da Presidência da República. Entretanto, as informações anteriores mostraram a troca de fotografias entre MAURO CID e o contato associado ao ex-Presidente JAIR BOLSONARO“, trecho do relatório da Polícia Federal, parte 21, página 197.

Quais valores as joias do caso Bolsonaro movimentou
A investigação liderada pelo Delegado de Polícia Federal Fábio Alvarez Shor, apontou inicialmente um valor de US$ 4.55 milhões, ou R$ 25.3 milhões. No entanto, revisões subsequentes reduziram esse montante para US$ 1.227.725,12, ou R$ 6.826.151,66 milhões.
No relatório de 2.041 páginas, rico em detalhes, números, estimativas, fluxogramas e etc. Tem gerado mais dúvidas do que respostas. Entre as diversas revisões de valores e a devolução dos itens, fica a pergunta: qual é a real implicação para Bolsonaro? Embora a Polícia Federal aponte enriquecimento ilícito, os valores efetivamente arrecadados com a venda das joias são substancialmente menores do que os inicialmente divulgados.
“Os bens que foram objeto dos atos de desvio e tentativa de desvio perpetrados pela associação criminosa com a finalidade de enriquecimento ilícito do ex-presidente JAIR BOLSONARO foram submetidos à procedimento pericial, com o objetivo, dentre outros, de aferir o valor mercadológico dos bens. Nesse sentido, o valor parcial dos presentes entregues por autoridades estrangeiras ao então presidente da República JAIR BOLSONARO, ou por agentes públicos a seu serviço, que foram objeto da atuação da associação criminosa, com a finalidade propiciar o enriquecimento ilícito do ex-presidente, mediante o desvio dos referidos bens ao seu patrimônio pessoal, somou o montante de US$ 4.550.015,06 ou R$ 25.298.083,73 (considerando a cotação Ptax de venda do dólar de R$ 5 ,56 em 03 /07/2024).”, trecho do relatório, parte 19, página 147.

Relatório incongruente da Polícia Federal em relação as joias do caso Bolsonaro
Por exemplo, segundo o relatório da PF, a PRECISION WATCHES INCORPORATED pagou pelos relógios Rolex Day-Date US$ 33 mil, ou R$ 183 mil, e o relógio Patek Philippe US$ 35 mil, ou R$ 194 mil. Já a SEYBOLD JEWELRY BUILDING desembolsou US$ 18 mil, ou R$ 100 mil pelo “kit ouro branco”, onde na planilha do Sr Shor aparecem desmembradas com valores que somariam US$ 73.749,50, ou R$ 410 mil, referente ao relógio Rolex Day-Date; mais US$ 20 mil, ou R$ 111.20 mil, referente a caneta Chopard-Rollerball.
No entanto a PRECISION WATCHES INCORPORATED e a SEYBOLD JEWELRY BUILDING pagaram efetivamente US$ 86mil, ou R$ 478 mil pelos itens acima citados. Gerando incongruência com as estimativas da PF que sugerem neste aspecto a soma de US$ 144.749,50, ou R$ 805 mil.
Resumo: | ||
Item | Valor pago | Valor estimado pela PF |
Relógio Rolex Day-Date (kit outo branco) | US$ 33 mil | US$ 73.749,50 |
Relógio Patek Philippe | US$ 35 mil | US$ 51 mil 1 |
Kit ouro branco (caneta da marca Chopard, par de abotoaduras, anel e rosário árabe) | US$ 18 mil | US$ 20 mil 2 |
TOTAL | TOTAL | |
US$ 86 mil, ou R$ 478 mil | US$ 144.749,50, ou R$ 805 mil |
- Segundo afirmação ao GLOBO;
- Segundo planilha da PF, só caneta Chopard valeria US$ 20 mil.


Analisando somente esta pequena amostra; sugerem sérias incongruências com o relatório da Polícia Federal. Apesar da dinâmica no layout do relatório com planilhas, diagramas, transcrições intuitivas com ‘fotinhas‘ dos envolvidos, parece que o relatório carece de revisão e abordagem objetiva com seus dados. Será um trabalho árduo para os advogados do ex-presidente Jair Bolsonaro, analisar, contextualizar, compreender e contestar as 2.041 páginas do relatório da PF.

O que fica é uma pergunta: — Existem mais incongruências no relatório da PF?
Segundo o advogado do ex-presidente, o Dr Paulo Cunha Bueno disse em entrevista ao jornalista e comentarista político Paulo Figueiredo que “é muito importante entender que todos os bens, joias, etc. Que são objeto desse inquérito foram devolvidos” ao “Acervo Público de Bens” que constitui os itens “presenteados ao estado brasileiro e que devem permanecer no Palácio do Planalto”.
O que diz as leis sobre os presentes recebidos pelo ex-presidente Jair Bolsonaro
Dr. Paulo Cunha Bueno explica que as leis sobre os presentes e joias para presidentes tiveram início em 1991, com a Lei nº 8.394, do governo Collor. Ele destaca que antes dessa legislação, não havia regulamentação sobre o assunto. Segundo Dr. Paulo, “Em 1991 vem uma lei do governo Fernando Collor que estabelece alguma linha sobre isso e basicamente dizia que os presentes recebidos… ingressariam no acervo privado da Presidência e com eles ficariam.” A regulamentação foi sendo aperfeiçoada ao longo dos anos, especialmente com o decreto de 2002 e a portaria de 2018.
O debate destaca a falta de clareza e as zonas cinzentas nas regulamentações, especialmente na definição de bens personalíssimos. A evolução das leis mostra um esforço para regulamentar e diferenciar entre o que pertence ao estado e o que pode ser considerado propriedade privada do presidente. A falta de definição clara no Acordão do TCU de 2016 levou à criação da Portaria nº 59 de 2018 para esclarecer o que se considera um bem personalíssimo.
De acordo com a legislação brasileira e as regulamentações subsequentes, os presentes de natureza personalíssima recebidos pelo Presidente da República são considerados propriedade privada do presidente. A definição de bens personalíssimos inclui itens como joias, semijoias, bijuterias, condecorações, vestuários, artigos de toalete, roupas de casa, perecíveis, e artigos de escritório.
Linha do tempo das leis sobre a temática:
1991: LEI Nº 8.394, de 30 de dezembro de 1991
Art. 2° Os documentos que constituem o acervo presidencial privado são na sua origem, de propriedade do Presidente da República, inclusive para fins de herança, doação ou venda.
Art. 3° Os acervos documentais privados dos presidentes da República integram o patrimônio cultural brasileiro e são declarados de interesse público para os fins de aplicação do § 1° do art. 216 da Constituição Federal, e são sujeitos às seguintes restrições:
I – em caso de venda, a União terá direito de preferência; e
II – não poderão ser alienados para o exterior sem manifestação expressa da União.
2002: DECRETO Nº 4.344, de 26 de agosto de 2002
Art. 6º A adesão ao Sistema de Acervos Documentais Privados dos Presidentes da República far-se-á por meio de termo específico, do qual constará que:
I – os acervos documentais privados dos presidentes da República integram o patrimônio cultural brasileiro e são declarados de interesse público para os fins de aplicação do § 1o do art. 216 da Constituição, conforme o art. 3o da Lei no 8.394, de 1991;
II – em caso de venda do acervo, a União tem direito de preferência, observado o disposto no art. 10;
III – sem prejuízo do disposto no inciso II, os acervos não podem ser alienados para o exterior sem manifestação expressa da União, por meio da Comissão Memória dos Presidentes da República;
2016: Acórdão do TCU determina a incorporação ao patrimônio da União de todos os documentos e presentes recebidos pelos presidentes a partir da publicação do decreto de 2002, excluindo apenas os itens de natureza personalíssima ou de consumo próprio. Por causa do novo entendimento, Lula (PT) e a ex-presidente Dilma Rousseff (PT) tiveram que devolver, ao todo, 471 presentes que tinham sido incorporados aos respectivos acervos pessoais.
2018: PORTARIA Nº 59, de 8 de novembro de 2018
O ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência do governo Temer (MDB), Ronaldo Fonseca, assina uma portaria que classifica joias, semijoias e bijuterias como bens de natureza personalíssima.
Art. 8º Os bens caracterizados como documento bibliográfico, audiovisual, textual ou museológico, nos termos legais, ou serão incorporados ao acervo patrimonial da Presidência da República nas seguintes hipóteses:
I – recebidos pelo Presidente da República e consorte em situações caracterizadas oficialmente como cerimônias de troca de presentes;
II – recebidos em viagens de Estado do Presidente da República ao exterior;
III – recebidos pelo Presidente da República quando das visitas oficiais ou viagens de Estado de Chefes de Estado e de Governo estrangeiros ao Brasil; e
IV – recebidos protocolarmente, em decorrência de relações diplomáticas vigentes.
Parágrafo único. Os bens de que tratam os incisos do caput que forem de natureza perecível ou personalíssima não serão incorporados ao acervo patrimonial da Presidência da República.
DOS CONCEITOS E DAS DEFINIÇÕES
IV – Bem de natureza personalíssima ou de consumo direto pelo recebedor: bens que, pela natureza, destinam-se ao uso próprio do recebedor, a exemplo das condecorações (grão colar, medalhas, troféus, prêmios, placas comemorativas), vestuários (camisa, calça, sapato, boné, chapéu, pijama, gravata), artigos de toalete (perfumes, maquiagem, cremes, diversos), roupas de casa (cama, mesa, banho), perecíveis (frutas secas, chás, bebidas alcóolicas, castanhas), artigos de escritório (canetas, cadernos, agendas, risque-rabisque, pastas), joias, semijoias e bijuterias;
Diante dessa complexa teia de valores, devoluções, leis — o debate sobre a verdadeira natureza das acusações contra Bolsonaro permanece aberto. Se por um lado a investigação busca responsabilizá-lo, por outro, a devolução das joias sugere um prejuízo nulo ao erário, ainda que neste caso as leis digam que itens de natureza personalíssima são de propriedade do Presidente da República. A narrativa, antes clara, agora se encontra enevoada, refletindo a complexidade e a volatilidade do cenário político brasileiro.
Fontes:
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